24.10.12

As imperfeições e polêmicas do edital do Maracanã

Foto: Agência O Globo
Foi divulgada nesta semana a minuta do edital de concessão do Complexo Esportivo do Maracanã à iniciativa privada, e nela há vários pontos polêmicos e que merecem reflexão. Entre eles, a confirmação de que o estádio de atletismo Célio de Barros e o complexo aquático Júlio Delamare (foto) - que sediou o torneio de polo aquático nos Jogos Pan-Americanos de 2007 - serão demolidos e reconstruídos em outro terreno perto dali, pertencente ao Exército. Essas novas instalações, porém, seriam apenas para treinamento, não servindo para competições oficiais. No lugar das antigas arenas, deverão ser construídos estacionamentos e o novo Museu do Futebol do Maracanã. Mas tem mais.
 
Segundo a minuta, o ginásio Gilberto Cardoso - o famoso Maracanãzinho - deverá sofrer uma nova reforma, principalmente no piso e na acústica. Além disso, terá que perder cerca de dois mil lugares, diminuindo dos atuais 11.424 para 9.914. Só que há um problema: de acordo com o Comitê Olímpico Internacional, as competições de vôlei dos Jogos Olímpicos terão que ter um público mínimo de 12 mil espectadores. E o ginásio está programado para receber a modalidade em 2016.
 
Ainda há tempo para fazer mudanças. Mas relatos dão conta de que não é tão necessário fazer reformas no ginásio, considerado um dos mais modernos do país. Essa obsessão dá margem a desconfianças de pretensão de superfaturamento, mesmo numa concessão à iniciativa privada por 35 anos. O Maracanãzinho é elogiado desde o Pan de 2007 e, por isso, não há a necessidade de modificações. Que, no final das contas, o bom senso prevaleça.

7.10.12

Um enigma chamado Nuzman

Foto: Jorge William/Agência O Globo
Nesta sexta-feira, Carlos Arthur Nuzman foi eleito para seu quinto mandato consecutivo na presidência do Comitê Olímpico Brasileiro. Ele ocupa a instância máxima do esporte nacional desde 1995, depois de deixar o comando da Confederação Brasileira de Voleibol. Dos 33 votos disponíveis (o dele próprio; o do vice, André Richer; de João Havelange, presidente de honra da FIFA e ex-membro do Comitê Olímpico Internacional, condição da qual renunciou depois de ser acusado de corrupção no exercício do cargo de presidente da FIFA; além dos presidentes ou representantes de 30 confederações brasileiras de esportes olímpicos), Nuzman, que era candidato único, obteve 30; foram duas abstenções (as dos presidentes da Confederação Brasileira de Futebol, José Maria Marin, e da Confederação Brasileira de Vela e Motor, Carlos Luís Martins) e apenas um voto contrário - o do presidente da Confederação Brasileira de Desportos no Gelo, Eric Maleson, que acusa o COB de perseguição política, por ser a única oposição declarada a Nuzman. É apenas mais um capítulo do festival de polêmicas em que o Comitê Olímpico Brasileiro se envolve, no início do ciclo olímpico que desembocará no Rio de Janeiro, em 2016.
 
O mais novo mandato de Nuzman deverá se encerrar em janeiro de 2017. Cumprindo-o até o fim, superará os 21 anos do primeiro presidente da entidade, Fernando Mendes Almeida (1914-1935) e ficará atrás somente dos 27 de Sylvio de Magalhães Padilha (1963-1990). Nuzman é apenas o oitavo presidente dos 98 anos de história do COB, atravessando uma época em que dinastias, continuísmos e mandatos eternos não fazem mais sentido - notadamente no Brasil, que vive uma democracia há 27 anos ininterruptos. Mas o esporte parece não seguir essa tendência de mudanças e alternâncias de poder, tanto que a grande maioria dos votantes que reelegeram Nuzman presidem suas confederações esportivas há anos, alguns deles há décadas. Os brasileiros se mostram mais realistas do que o rei, visto que o próprio Comitê Olímpico Internacional mudou seu estatuto para limitar os mandatos de seus presidentes - as acusações contra o então presidente Juan Antonio Samaranch (que presidiu o COI durante 21 anos, de 1980 a 2001) o desgastaram de tal forma que a instância máxima do esporte mundial limitou o primeiro mandato do presidente em oito anos, dando a chance de uma única reeleição, por mais quatro anos; o atual presidente, o belga Jacques Rogge, foi eleito em 2001, reeleito em 2009 e passará o cargo em 2013.
 
É inegável que Nuzman fez o esporte olímpico brasileiro crescer durante seu mandato. Até ele assumir o cargo, o Brasil ganhava poucas medalhas em uma única edição olímpica - o recorde no geral tinha sido em 1984, com oito medalhas; o maior número de ouros tinha sido dois, em 1980 e 1992. Logo na primeira Olimpíada sob a presidência de Nuzman, foram quinze medalhas - três delas de ouro. Daí em diante, nunca foram menos do que dez medalhas brasileiras por Olimpíada - este menor número foi em 2004, quando o Brasil obteve cinco ouros, seu recorde até hoje. O fato é que a atual presidência fez o país crescer no cenário olímpico, bem mais do que era antes.
 
Mas esse período, que poderia ser visto como vitorioso, também tem seus percalços. Não há uma política esportiva clara no país, mesmo com o crescimento no número de medalhas olímpicas. Na maior parte das vezes, a delegação brasileira depende de talentos individuais, daqueles que treinam sob seus próprios esforços, quase sempre sem ajuda dos dirigentes. Milhões de reais em dinheiro público, investido há quase duas décadas, não chegam a quem deveriam chegar. Os investimentos não dão retorno, ou o número de medalhas seria bem maior. Um exemplo se deu neste ano, em Londres, quando o número de finais em que brasileiros estiveram envolvidos foi bem menor que tinha sido em Pequim, apesar do maior número de medalhas conquistadas.
 
Para piorar as coisas, a reeleição de Nuzman chega num momento em que o COB vive uma crise de credibilidade. Pouco depois do encerramento dos Jogos Paralímpicos de Londres, chegou ao conhecimento público que o Comitê Organizador dos Jogos da XXXI Olimpíada e dos XV Jogos Paralímpicos Rio 2016 demitiu nove integrantes, acusados de roubo de informações sigilosas pertencentes ao Comitê Organizador dos Jogos de Londres. Apenas isso foi divulgado: não foram revelados detalhes sobre como seriam esses documentos, nem para que eles serviriam, nem mesmo se os demitidos os extraviaram por conta própria ou a mando de algum superior. A pressão da imprensa e da opinião pública fez Nuzman dar uma entrevista coletiva, mas que pouco ou nada esclareceu sobre o ocorrido.
 
Além de presidente do COB, Nuzman também é presidente do Comitê Organizador Rio 2016 - o que não é recomendado por causa do risco de conflito de interesses, apesar de o COI não proibir. Ele também presidiu o Comitê Organizador dos Jogos Pan-Americanos de 2007, que, se organizou bem o evento a ponto de credenciar a cidade a sediar os Jogos Olímpicos de 2016, também foi marcado pelo superfaturamento dos locais de prova. O acúmulo de funções lembra algo bem conhecido: Ricardo Teixeira, presidente da CBF durante 23 anos, também era o presidente do Comitê Organizador Local da Copa do Mundo de 2014. No começo deste ano, Teixeira renunciou aos dois cargos - hoje ocupados por seu sucessor, José Maria Marin - por conta de sucessivas acusações de corrupção. Se houver acusações parecidas contra Nuzman, que ninguém duvide que o presidente do COB tenha de fazer o mesmo, até para salvar sua recém-manchada biografia...